Topo

Histórico

Categorias

Blog do Maurício de Souza Lima

Faça exames em vez de presumir que o jovem tem intolerância à lactose

Maurício de Souza Lima

11/03/2020 04h00

Crédito: iStock

Dores de barriga, inchaço abdominal, diarreia —estes são sinais clássicos de um problema muito comentado nos últimos tempos, a intolerância à lactose. E, quando esse distúrbio existe pra valer, podem surgir ainda náuseas, crises de vômito, azia, dores de cabeça… Sim, o dia a dia pode ficar infernal. Mas aí é que está: os mesmos sintomas costumam aparecer em outros problemas digestivos e a gente precisa ter cautela em vez de tirar conclusões precipitadas. Em outras palavras, a gente precisa pedir exames para confirmar se é mesmo mais um caso de intolerância à lactose.

Eu, particularmente, sempre que possível indico que o paciente faça de cara um teste genético simples, por meio do sangue, para saber se ele, em primeiro lugar, tem de fato uma predisposição a esse problema. E a gente sabe que muitas pessoas, mesmo tendo a lactase normal —enzima digestiva encarregada de quebrar a lactose, o açúcar do leite, e de seus derivados — podem de fato ser mais sensíveis a esse alimento. 

Na adolescência, isso merece cuidado por vários motivos. Um deles é que a capacidade de digerir a lactose tende a se reduzir ao longo dos anos. Se já aparece cedo… Idealmente a intolerância nem deveria existir na adolescência, embora ocorra. Isso porque é uma fase em que o consumo de laticínios é importante, por serem grandes fornecedores de cálcio, para formar no esqueleto uma espécie de reserva ou poupança desse mineral que, com certeza, será muito bem aproveitada pelo restante da vida.

Bom eu lembrar que intolerância não é alergia —reação do sistema imunológico a uma proteína do leite. Quem é alérgico não pode tomar uma gota da bebida sem passar mal. Já com o intolerante a coisa é diferente. Ele pode consumir uma determinada quantidade sem sentir nada. Mas, ao ultrapassar a barreira da dose de que seu organismo dá conta —a qual varia muito de indivíduo para indivíduo — , vai sentir o mal-estar. 

Médico e paciente precisam, então, encontrar essa porção que seria bem aceita pelo organismo. Sou contra cortar os laticínios de vez por causa da intolerância, o que só piora o quadro —não apenas pelas questões nutricionais, já que o cálcio faz uma falta danada, mas porque, sem ser exposto à lactose, o organismo vai deixando cada vez mais de produzir a enzima para dar conta dela. E a intolerância se agrava. Lembrando que a tendência é só piorar com a idade…

Existem alternativas. Os iogurtes, por exemplo, têm cerca de 1/4 da lactose do leite, se compararmos a mesma porção. É uma opção. Os queijos também têm menos lactose por natureza —e quanto mais curados, menos ainda. Por último, além de os supermercados oferecerem uma gama de laticínios sem lactose, sempre existe a alternativa de o adolescente engolir cápsulas da enzima lactase para completar o que seu organismo já não produz.

Outra orientação que costumo dar é para o adolescente nunca consumir leite e seus derivados de estômago vazio, o que contribui para a sensação de ficar estufado. Aliás, a dica de ouro é consumir leite sempre com frutas e cereais. Explico: as fibras, além de facilitarem o trânsito no intestino, diminuem o risco de cólicas, caso fique sobrando ali um pouco de lactose não digerida.

Fundamental, como eu já disse, é fazer exames para entender se existe mesmo uma predisposição a essa dificuldade digestiva, em vez de sair tirando laticínios do cardápio à toa.

Sobre o autor

Maurício de Souza Lima é hebiatra, ou seja, um clí­nico geral especializado na saúde de adolescentes. Doutor em Medicina pela Universidade de São Paulo, é autor do livro “Filhos Crescidos, Pais Enlouquecidos” (Editora Landscape), vencedor do Prêmio Jabuti em 2007.

Sobre o blog

Aqui, Maurí­cio de Souza Lima pretende abordar de maneira leve e objetiva todas as questões de saúde que podem preocupar ou despertar a curiosidade dos próprios adolescentes e dos seus pais. Aliás, prefere dizer que irá falar sobre a saúde da juventude, lembrando que oficialmente a adolescência começa aos 10 anos, mas em tempos modernos, na prática, pode se estender para bem mais de 21 anos.

Blog do Maurício de Souza Lima