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Blog do Maurício de Souza Lima

Transtorno de conduta: quando a agressividade forte dura mais de seis meses

Maurício de Souza Lima

17/07/2019 04h00

Crédito: iStock

Existe aquilo que nós, na área da hebiatria, chamamos de síndrome do adolescente normal. O fenômeno é bem conhecido: o garoto ou a garota começa a se afastar progressivamente dos pais (que às vezes sofrem com isso, como se fossem rejeitados), tende a ficar mais com o grupo de amigos, adora problematizar qualquer assunto, cai em contradições com frequência e, claro, sofre das famosas flutuações do estado de ânimo, indo do riso ao choro ou da boa disposição à irritabilidade em minutos. Isso é normal, faz parte e, garanto, passa. Tem a ver com hormônios, amadurecimento do córtex pré-frontal no cérebro e, claro, fatores comportamentais. No entanto, há um outro quadro que não pode ser confundido com as alterações de humor dessa síndrome que, como o próprio nome indica, é absolutamente normal: eu estou falando do transtorno de conduta, um problema que merece atenção.

Muitas vezes, ele surge até um pouco antes dos 10 anos, idade oficial da entrada na adolescência, e ninguém sabe direito as causas. Apenas se desconfia que o consumo de álcool possa agravar a situação, quando o menino ou a menina experimenta bebida, ainda que em baixas doses, cedo demais. Mas nem isso é tão certo…  Seja como for, o jovem assume uma postura desafiadora, agressiva, antissocial. Claro, ele pode estar passando por problemas — quem nunca? Mas, na área da saúde, o consenso é de que esse estado de bomba prestes a explodir é considerado transtorno de conduta quando se estende por seis meses ou mais. Bom observar.

Em geral, quando inicia, as pessoas logo rotulam o adolescente de problemático, sem entender que a situação pode se agravar, indo além da travessura ou da rebeldia da idade. Alguns estudiosos afirmam que o transtorno da conduta coloca os jovens em risco de comer até mesmo delitos de toda ordem.

O que se observa é que esse rapaz ou essa moça, aos poucos, perde a noção do sentimento do outro. Pode fazer coisas terríveis e, se isso é questionado pelos pais ou pela escola, se mostrar um tanto alheio, como se não existisse a culpa, nem o remorso. Na verdade, psicólogos notam que esse jovem sempre costuma jogar a responsabilidade para o outro — acusa o amigo de ter provocado uma reação de irritabilidade extrema, porque acredita piamente nisso.

Quando fica irritado, outro traço é a vontade de liberar o nervosismo fisicamente — pode dar socos na parede ou, o que é bem mais comum, quase um reflexo, lançar o que tiver nas mãos, seja um lápis, um livro ou um computador. Esse comportamento impulsivo e agressivo muitas vezes só se manifesta na escola — é quando os pais, em alguns casos, não reconhecem a queixa dos professores e orientadores, optando simplesmente por mudar o filho de colégio. O fenômeno também pode aparecer apenas em casa e, ai, há quem diga que pode existir uma tendência à crueldade com animais de estimação.  

O fato é que o transtorno de conduta surge onde esse adolescente está mais sujeito às frustrações, com as quais não lida nada bem. Mas, de novo, não confunda com a imagem do garoto mimado — ele não chora fazendo manha, ele não fica triste. É agressivo e ponto. Se nada for feito, o quadro seguirá adiante, prejudicando todos os seus relacionamentos na adolescência e na vida adulta. 

Ninguém sabe direito as bases neurológicas dessa condição, mas todos concordam: esse adolescente precisa depressa de ajuda. No caso, de terapia ou até mesmo de medicamentos. O médico capacitado para analisar a situação e confirmar o diagnóstico é o psiquiatra.

Sobre o autor

Maurício de Souza Lima é hebiatra, ou seja, um clí­nico geral especializado na saúde de adolescentes. Doutor em Medicina pela Universidade de São Paulo, é autor do livro “Filhos Crescidos, Pais Enlouquecidos” (Editora Landscape), vencedor do Prêmio Jabuti em 2007.

Sobre o blog

Aqui, Maurí­cio de Souza Lima pretende abordar de maneira leve e objetiva todas as questões de saúde que podem preocupar ou despertar a curiosidade dos próprios adolescentes e dos seus pais. Aliás, prefere dizer que irá falar sobre a saúde da juventude, lembrando que oficialmente a adolescência começa aos 10 anos, mas em tempos modernos, na prática, pode se estender para bem mais de 21 anos.

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