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Blog do Maurício de Souza Lima

Enurese noturna: quando o adolescente faz xixi na cama

Maurício de Souza Lima

15/05/2019 04h00

Crédito: Istock

A queixa é mais frequente do que se imagina: até 15% dos jovens entre 12 e 14 anos já tiveram a experiência de acordar com os lençóis molhados. A perda involuntária de urina é considerada um quadro mais preocupante de enurese noturna — esse é o nome do problema em questão — quando se repete pelo menos uma ou duas vezes por semana. Mas há até mesmo casos em que o jovem nunca consegue segurar o xixi quando está dormindo.

Em outros meninos e meninas, porém, pode haver aquilo que chamamos de uma enurese secundária: eles ficam até seis meses dormindo de boa, acordando secos. Mas então o xixi noturno reaparece e essa volta, em geral, é associada a algum episódio mais estressante no dia a dia.

Com estresse ou não, sempre pode existir por trás dessa condição, bastante constrangedora para uns, uma demora maior do amadurecimento do sistema nervoso no que diz respeito ao controle dos esfíncteres, as válvulas que fecham as comportas e não deixam o xixi passar. 

A tarefa, claro, fica mais difícil se, além dessa imaturidade neurológica, o garoto for para a cama com a bexiga bem cheia. Soma-se a isso uma realidade: os adolescentes têm mesmo um sono mais pesado. Ou seja, a vontade de fazer xixi, no caso deles, pode passar batido, assim como o som do despertador matinal.

Diante de casos assim, os médicos precisam investigar se, além da imaturidade dos mecanismos que prendem a urina, não seria o caso de uma dosagem mais baixa de hormônios antidiuréticos. Afinal, eles, entre outras coisas, diminuem a produção de urina pelos rins quando estamos adormecidos. Ora, se a urina continuar sendo produzida em volume normal, como se fosse em pleno dia, aí mesmo é covardia… Os médicos também precisam descartar doenças, como o diabetes, que aumentam a quantidade de xixi, e outros desequilíbrios hormonais.

Há sempre um fator hereditário, fique sabendo: quatro em cada dez adolescentes que fazem xixi na cama são filhos de pai ou de mãe que também levavam esse susto no meio da madrugada. Se os dois pais sabem do que estou falando, a probabilidade de o filho ter enurese noturna dobra.

O tratamento vai variar conforme o paciente, incluindo uma boa avaliação do impacto emocional do problema. Tem jovem que fica até com medo de dormir fora de casa — aí, estamos diante de alguém que precisa de ajuda ligeiro para a enurese não atrapalhar a convivência social e, claro, a autoestima.

Algumas dicas ajudam. Uma delas é evitar líquidos antes de dormir, assim como alimentos muito ácidos, como abacaxi e tomate, no jantar. Antes de se deitar, o jovem precisa se lembrar de ir ao banheiro — parece óbvio, mas os adolescentes despencam na cama sem mais, nem menos. Broncas, acho que nem preciso dizer: não resolvem e só pioram. 

Alguns medicamentos dão bons resultados, mas só devem ser usados depois de uma boa conversa com o médico. Afinal, eles podem atrapalhar a ação dos hormônios do crescimento. Então, eu pessoalmente acredito que devam ser reservados para aqueles casos em que a enurese noturna está atrapalhando demais e que a fase do estirão já tenha passado. Há, ainda, pacientes que respondem bem a alguns ansiolíticos. Tudo é uma questão de a gente refletir bem sobre o caso.

Um último conselho é fazer o jovem beber muito, muito mesmo, líquido durante o dia, até às 16 horas. Explico: isso treina o sistema nervoso a perceber a sensação da bexiga cheia. Sim, para ele, segurar o xixi é questão de treino. E, bem treinado, ele logo amadurecerá. Então os lençóis amanhecerão secos.

Sobre o autor

Maurício de Souza Lima é hebiatra, ou seja, um clí­nico geral especializado na saúde de adolescentes. Doutor em Medicina pela Universidade de São Paulo, é autor do livro “Filhos Crescidos, Pais Enlouquecidos” (Editora Landscape), vencedor do Prêmio Jabuti em 2007.

Sobre o blog

Aqui, Maurí­cio de Souza Lima pretende abordar de maneira leve e objetiva todas as questões de saúde que podem preocupar ou despertar a curiosidade dos próprios adolescentes e dos seus pais. Aliás, prefere dizer que irá falar sobre a saúde da juventude, lembrando que oficialmente a adolescência começa aos 10 anos, mas em tempos modernos, na prática, pode se estender para bem mais de 21 anos.

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