O uso perigoso de remédio para déficit de atenção em época de provas
Há uma onda entre os adolescentes: a de tomar indiscriminadamente remédios indicados para quem sofre de transtorno de hiperatividade e déficit de atenção (THDA) nas semanas de provas no colegial, de simulados do vestibular ou de testes na faculdade. Alguns chegam a abrir as cápsulas para cheirar o pó em seu conteúdo horas antes da avaliação.
Sim, o efeito do princípio ativo pode até ser mais imediato se a pessoa o inala. Mas, pelo caminho, ele faz um estrago daqueles nas mucosas nasais, só para começo de conversa. Tanto que as cápsulas, uma vez engolidas como o esperado, se derreteriam apenas do intestino, entre outros motivos para evitar irritações nas paredes do estômago. No entanto, isso tudo é até o de menos. O principal recado é que essa estratégia para melhorar o desempenho nos estudos pode fazer muito mal e, decididamente, não funciona. O que existe é uma ilusão.
Os jovens procuram o médico pedindo a prescrição do remédio, alegando que não conseguem se concentrar direito nas aulas. Eles até mesmo conseguem adquirir a medicação em um mercado negro que infelizmente não para de crescer, sempre rondando escolas e universidades.
As drogas de que dispomos hoje em dia são muito úteis, mas para quem tem realmente um quadro confirmado de THDA — um problema que deve ser diagnosticado por uma equipe multidisciplinar, envolvendo no mínimo médicos e psicólogos. Para quem não apresenta THDA, o efeito de qualquer medicação será, como já disse, mais ilusório do que qualquer outra coisa.
Isto é, se em determinado organismo não faltam os neurotransmissores envolvidos nos processos de atenção do sistema nervoso central, a medicação apenas afastará a sonolência, já que tem uma ação estimulante. E, para isso, poderá cobrar um preço alto, pois seus efeitos colaterais estão longe de ser inócuos.
A pressão arterial de quem toma um medicamento para aumentar a atenção tende a subir. Por isso, deve ser monitorada. O pressão intraocular também pode se elevar, provocando um glaucoma precocemente. Nos meninos, podem ocorrer episódios de priapismo, ereções dolorosas, que muitas vezes exigem a intervenção do médico urologista. A digestão, às vezes, fica alterada. A quantidade de leucócitos no sangue , células brancas de defesa , corre igualmente o risco de alterações. Não é uma lista pequena de problemas.
Por isso, quando alguém tem THDA pra valer, os profissionais de saúde acompanham as reações do seu organismo à medicação o tempo inteiro, pesando custos e benefícios e, não raro, diminuindo as dosagens para contrabalançar qualquer prejuízo. Não é o que acontece, porém, com o garoto que engole, ou pior, inventa de cheirar o remédio em véspera de uma prova. Ele, ao contrário, pela minha experiência clínica costuma até perder completamente o controle da dose que está consumindo do remédio.
O fato é que não existe mágica. Nenhuma cápsula faz uma nota 5 virar nota 10. Difícil é convencer o adolescente disso. Até porque, ao perder o sono — e, aliás, distúrbios importantes de sono são comuns entre os usuários —, o jovem tem a impressão de que seus estudos estão rendendo mais.
Só posso dizer que horas insones em cima de livros não significam que alguém está, de fato, guardando com eficiência as informações na memória. E "ficar mais ligado" também não quer dizer que o raciocínio será claro na hora de responder as questões de um teste. Essa espécie de efeito pode fazer a diferença para quem tem realmente um transtorno de ordem neurológica, compensando déficits de neurotransmissores — e só. Para os demais usuários, nada melhor do que evitar o excesso de cansaço, seja pelos estudos ou pelas baladas sem fim, tentar dormir direito, estudar na hora certa. E se, na véspera da prova, sentir a tal sonolência, uma bela xícara de café pode ser a melhor pedida.
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