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Blog do Maurício de Souza Lima

Não dá para a adolescente sair tomando qualquer pílula anticoncepcional

Maurício de Souza Lima

03/01/2018 04h00

Crédito: iStock

Todo mundo sabe: a pílula anticoncepcional é vendida sem receita médica. Ninguém tem dificuldade alguma para sair da farmácia levando a sua cartela. Só que aviso: no caso de uma adolescente, a prescrição precisa ser muito criteriosa. Não dá para a menina simplesmente comprar aquela mesma pílula que a amiga está tomando. Uma atitude que, infelizmente, é comum entre as jovens.

A questão aí não são os hormônios do medicamento. Eles já foram uma preocupação importante. Hoje, não mais. Se a gente pensar, quando os contraceptivos orais surgiram nos anos 1960,  uma única pílula tinha a mesma quantidade hormonal de uma caixa inteira dos anticoncepcionais de agora. As dosagens hormonais andam mesmo baixíssimas. Então, os efeitos colaterais também se tornaram bem menos pronunciados.

Às vezes, é a mãe que tem medo, porque, no passado, ela engordou ao usar o anticoncepcional. A própria jovem ouve falar de estrias, celulite… Bobagem, porque esses problemas têm a ver com uma tendência genética e, com a dosagem hormonal atual, dificilmente a pílula será tão culpada assim por eles. Outro temor é o de, no futuro, ter dificuldade para engravidar, ainda mais usando o contraceptivo oral desde cedo. Esqueça: no dia em que interromper o uso, a jovem poderá engravidar de boa.

Mesmo assim, para prescrever uma pílula anticoncepcional, o médico precisa analisar o resultado de uma série de exames de laboratório e vasculhar, até pelo histórico familiar, a possibilidade de certas características genéticas que predispõem a problemas no sangue. Essa, sim, é a grande questão. O remédio, entre outros transtornos na circulação, favorece a formação de trombos. E esse gatilho pode ser acentuado pelo uso de uma pílula menos adequada na adolescência.

Apague também a ideia de existir uma formulação de pílula mais apropriada para garotas adolescentes — é outro mito. Há diversos tipos: as que têm apenas progesterona; as que têm somente estrógeno; as que combinam os dois hormônios; as que são tomadas ao longo de 21 ou de 24 dias para, daí, a menina pausar ou aquelas que são engolidas durante o ciclo inteiro, sem interrupção. Mas é sempre  o organismo feminino, independentemente da idade, que dita a escolha mais adequada. E, no caso das meninas, quem prescreve não é o hebiatra —  o especialista em adolescente, como eu — e, sim, o ginecologista.

Aqui vale parênteses: se passou um ano ou dois anos da primeira menstruação ou se a adolescente já completou 15 anos, os pais devem levá-la ao ginecologista, não importa se ela tem vida sexual ativa ou não. Nessa idade, o exame ginecológico é importante e a mãe não deve ficar do lado, para evitar constrangimentos. e até mesmo mentiras que não levarão a canto algum.

O ginecologista, depois de ver os resultados dos exames, poderá prescrever a pílula por uma série de motivos. Por exemplo, para resolver um fluxo menstrual muito intenso ou aqueles casos em que a menina permanece menstruada por vários dias, impactando sua qualidade de vida. Outras vezes, a pílula é necessária para equilibrar alguma questão hormonal que pode estar por trás de outros problemas, como a acne.

E, claro, a pílula é uma opção para afastar uma gravidez indesejada se a garota já iniciou sua vida sexual.  Mas só quero lembrar que nenhum método anticoncepcional é 100 por cento eficaz. Para aumentar sua eficiência, além de checar a formulação mais compatível com cada organismo, o médico precisa ficar atento para ver se a menina se adapta. Ora, ela precisa se acostumar a tomar o pílula todos os dias e no mesmo horário. Tudo bem que, hoje em dia, o alarme do celular ajuda. Mas, às vezes, ele toca e o remédio não está na bolsa.

Outro detalhe pode fazer o gineco pensar duas vezes antes de indicar a pílula como método contraceptivo: a frequência do sexo. Se ele for rolar só em cada 15 dias, quando o apartamento dos pais ficar vazio por algum motivo, não valerá a pena correr o risco de um problema de circulação no futuro. Se a oportunidade de transar é esporádica, vale muito mais ficar no uso da camisinha. O preservativo, aliás, não deve ser descartado nunca. Ora, a pílula pode evitar um bebê não programado, mas não afasta a possibilidade de uma doença sexualmente transmissível.

Sobre o autor

Maurício de Souza Lima é hebiatra, ou seja, um clí­nico geral especializado na saúde de adolescentes. Doutor em Medicina pela Universidade de São Paulo, é autor do livro “Filhos Crescidos, Pais Enlouquecidos” (Editora Landscape), vencedor do Prêmio Jabuti em 2007.

Sobre o blog

Aqui, Maurí­cio de Souza Lima pretende abordar de maneira leve e objetiva todas as questões de saúde que podem preocupar ou despertar a curiosidade dos próprios adolescentes e dos seus pais. Aliás, prefere dizer que irá falar sobre a saúde da juventude, lembrando que oficialmente a adolescência começa aos 10 anos, mas em tempos modernos, na prática, pode se estender para bem mais de 21 anos.

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